O Contexto da Flexibilização Pontual
A década de 90 no Brasil foi caracterizada por um movimento
de modernização e desregulamentação em diversas esferas. No campo trabalhista,
a ideia era permitir que empresas tivessem maior agilidade para ajustar suas
operações às flutuações do mercado, sem necessariamente recorrer a demissões em
massa ou contratações permanentes que pudessem se tornar um fardo em momentos
de retração.
Não se tratava de uma reforma trabalhista abrangente, mas
sim de "flexibilização pontual", ou seja, a introdução de medidas
específicas que permitiam maior maleabilidade em aspectos como jornada e
remuneração, muitas vezes via negociação coletiva. Essa abordagem buscava um
equilíbrio entre a proteção do trabalhador e a necessidade de as empresas se
manterem competitivas em um cenário globalizado.
Banco de Horas: A Compensação que Virou Regra
Um dos mecanismos mais emblemáticos dessa era foi o
"banco de horas", que ganhou força legal justamente com a Lei nº 9.601/1998
(a mesma que instituiu o contrato por prazo determinado). Antes de sua
formalização, a compensação de jornada era rígida. Com a nova redação dada ao
art. 59 da CLT, as empresas ganharam a possibilidade de gerenciar as horas
extras de forma estratégica.
- O
que é o Banco de Horas? Em sua essência, permite que as horas extras
trabalhadas em um período sejam compensadas com a correspondente
diminuição da jornada em outro momento, em vez de serem pagas em dinheiro
com adicional.
- Impactos
para a Contabilidade: A implementação do banco de horas exigiu um
controle rigoroso. Para os contadores, isso significou a necessidade de
monitorar o ponto detalhado e validar a existência de Acordos ou
Convenções Coletivas (requisito obrigatório na época). O banco de
horas, quando bem gerido, reduz custos, mas sua complexidade de cálculo
adicionou uma camada de responsabilidade aos departamentos pessoais.
Acordos de Compensação de Jornada: Além do Banco de Horas
Paralelamente, os "acordos de compensação de
jornada" também ganharam destaque. Diferente do banco de horas (que lida
com saldo a longo prazo), a compensação clássica foca na semana.
- O
que são? Pactos para distribuir as horas da semana de forma diferente,
respeitando o limite constitucional. O exemplo clássico é a "Semana
Inglesa" ou "Espanhola", onde se trabalha mais de
segunda a sexta para suprimir o trabalho aos sábados.
- Relevância
Contábil: O contador precisa garantir que esses acordos estejam
devidamente formalizados. Erros aqui podem descaracterizar o acordo,
gerando passivos de horas extras retroativas.
Lei nº 9.601/1998: O Contrato por Prazo Determinado
O grande marco legislativo da década foi, sem dúvida, a Lei
nº 9.601, de 21 de janeiro de 1998. Ela não só pavimentou o caminho para o
banco de horas, como introduziu o contrato de trabalho por prazo determinado
desvinculado da CLT tradicional (que exigia a natureza transitória do serviço),
focando no aumento de postos de trabalho.
- A
Novidade: A lei permitiu contratações temporárias para qualquer
atividade da empresa, desde que houvesse aumento no quadro de
funcionários e previsão em acordo coletivo.
- Incentivos
Fiscais e Verbas: Para incentivar a adesão, a lei reduziu encargos
sociais e flexibilizou verbas rescisórias (isentando, por exemplo, o aviso
prévio e a multa de 40% do FGTS para esses contratos específicos, mediante
negociação).
- O
Papel do Contador: Foi crucial para auxiliar no planejamento de
contratações, verificando a elegibilidade da empresa e os limites
percentuais de temporários permitidos por lei, evitando a criação de
passivos ocultos.
O Legado dos Anos 90 para o Profissional Contábil
A década de 1990 deixou um legado duradouro. A introdução
dessas ferramentas transformou o contador: ele deixou de ser apenas um
"calculista" de folha para se tornar um consultor estratégico.
Compreender a gênese desses instrumentos — Banco de Horas,
Compensação e Contratos Flexíveis — é crucial, pois eles são a base das
discussões que culminaram, anos mais tarde, na Reforma Trabalhista de 2017. O
entendimento aprofundado dessa história permite uma atuação mais segura e
inteligente no dinâmico cenário trabalhista brasileiro.
Palavras-chave: flexibilização trabalhista, anos 90,
banco de horas, acordos de compensação, Lei 9.601/98, contrato por prazo
determinado, contabilidade trabalhista, gestão de jornada.
Referências Bibliográficas:
BRASIL. Lei nº 9.601, de 21 de janeiro de 1998.
Dispõe sobre o contrato de trabalho por prazo determinado e dá outras
providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 22 jan. 1998.
DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho.
São Paulo: LTr.
MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. São
Paulo: Atlas.
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do
Trabalho. São Paulo: LTr.
SÜSSEKIND, Arnaldo. Direito Constitucional do Trabalho.
Rio de Janeiro: Renovar.

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