Radio Evangélica

quarta-feira, 4 de junho de 2025

Tecnologia, Conhecimento Local e Sustentabilidade nos Andes

A sofisticação técnica das práticas incas revela uma profunda compreensão empírica do ambiente andino. Sem o uso da roda para transporte de carga nem da tração animal em larga escala, os incas desenvolveram um sistema altamente eficiente de circulação humana e de mercadorias, baseado em trilhas planejadas, aclives adaptados e sistemas de drenagem que garantiam a durabilidade das vias. A engenharia hidráulica, aplicada tanto à irrigação quanto à conservação de solos, refletia uma inteligência ecológica que buscava coexistência com a paisagem, e não sua dominação.

Os andenes — terraços agrícolas — não eram apenas soluções de plantio, mas instrumentos multifuncionais de preservação ambiental, captação de água e controle microclimático. Ao cultivar em cotas de altitude variadas, o império ampliava sua segurança alimentar e distribuía riscos climáticos, numa lógica de complementaridade produtiva típica da economia vertical andina. O saber técnico, acumulado e transmitido de forma oral e prática, era parte do patrimônio coletivo das ayllus e dos especialistas agrônomos chamados yachaqkuna.

O Estado como Gestor do Bem Comum

A atuação estatal incaico não se restringia à autoridade coercitiva, mas funcionava como organizador da produção e garantidor do bem-estar coletivo. O sistema de trabalho obrigatório, o mit’a, longe de significar apenas exploração, refletia uma reciprocidade institucionalizada: o Estado dispunha da força de trabalho comunitária para obras públicas, mas, em contrapartida, assegurava redistribuição de recursos e proteção em momentos críticos.

Além disso, a ausência de um sistema monetário e a predominância do escambo ritualizado não impediam o florescimento de uma economia dinâmica. A lógica era outra: produzir para o coletivo, e não para o mercado. As relações sociais de produção mantinham coesão e estabilidade, características centrais da durabilidade de um império que, mesmo sem escrita alfabética, conseguiu articular vastos territórios com alta eficiência administrativa.

Heranças e Desafios para o Presente

O modelo incaico de sustentabilidade infraestrutural e solidariedade estatal desafia paradigmas contemporâneos centrados no lucro e na exploração de recursos em escala ilimitada. Ao articular espiritualidade, engenharia, justiça distributiva e gestão do território, o Tahuantinsuyo demonstrou que é possível organizar sociedades complexas em harmonia com seu entorno.

As atuais discussões sobre desenvolvimento sustentável, economia circular e justiça climática podem encontrar nos Andes pré-colombianos exemplos práticos de viabilidade sistêmica, onde os pilares da resiliência não estavam apenas na técnica, mas nos valores coletivos e na ética de cuidado com a terra e com o outro.

Referências Bibliográficas Complementares

  • CUBERO, Jorge. Tecnología y organización social en los Andes: una mirada desde la arqueología. La Paz: Plural Editores, 2018.
  • GONZÁLEZ CARRÉ, Teresa. Saberes indígenas y prácticas agrícolas en el mundo andino. Quito: FLACSO, 2007.
  • GUTIÉRREZ, Ramón. Arquitectura y urbanismo en el mundo andino. Buenos Aires: CLACSO, 2002.
  • KOSTER, Rainer. Los Incas: planificación estatal y tecnología. Lima: Horizonte, 1992.
  • MORALES, Edmundo. The Guinea Pig: Healing, Food, and Ritual in the Andes. Tucson: University of Arizona Press, 1995.
  • UNESCO. Qhapaq Ñan – Andean Road System. Disponível em: https://whc.unesco.org/en/list/1459

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