Os andenes — terraços agrícolas — não eram apenas soluções
de plantio, mas instrumentos multifuncionais de preservação ambiental, captação
de água e controle microclimático. Ao cultivar em cotas de altitude variadas, o
império ampliava sua segurança alimentar e distribuía riscos climáticos, numa
lógica de complementaridade produtiva típica da economia vertical andina. O
saber técnico, acumulado e transmitido de forma oral e prática, era parte do
patrimônio coletivo das ayllus e dos especialistas agrônomos chamados yachaqkuna.
O Estado como Gestor do Bem Comum
A atuação estatal incaico não se restringia à autoridade
coercitiva, mas funcionava como organizador da produção e garantidor do
bem-estar coletivo. O sistema de trabalho obrigatório, o mit’a, longe de
significar apenas exploração, refletia uma reciprocidade institucionalizada: o
Estado dispunha da força de trabalho comunitária para obras públicas, mas, em
contrapartida, assegurava redistribuição de recursos e proteção em momentos
críticos.
Além disso, a ausência de um sistema monetário e a
predominância do escambo ritualizado não impediam o florescimento de uma
economia dinâmica. A lógica era outra: produzir para o coletivo, e não para o
mercado. As relações sociais de produção mantinham coesão e estabilidade,
características centrais da durabilidade de um império que, mesmo sem escrita
alfabética, conseguiu articular vastos territórios com alta eficiência
administrativa.
Heranças e Desafios para o Presente
O modelo incaico de sustentabilidade infraestrutural e
solidariedade estatal desafia paradigmas contemporâneos centrados no lucro e na
exploração de recursos em escala ilimitada. Ao articular espiritualidade,
engenharia, justiça distributiva e gestão do território, o Tahuantinsuyo
demonstrou que é possível organizar sociedades complexas em harmonia com seu
entorno.
As atuais discussões sobre desenvolvimento sustentável,
economia circular e justiça climática podem encontrar nos Andes pré-colombianos
exemplos práticos de viabilidade sistêmica, onde os pilares da resiliência não
estavam apenas na técnica, mas nos valores coletivos e na ética de cuidado com
a terra e com o outro.
Referências Bibliográficas Complementares
- CUBERO,
Jorge. Tecnología y organización social en los Andes: una mirada desde
la arqueología. La Paz: Plural Editores, 2018.
- GONZÁLEZ
CARRÉ, Teresa. Saberes indígenas y prácticas agrícolas en el mundo
andino. Quito: FLACSO, 2007.
- GUTIÉRREZ,
Ramón. Arquitectura y urbanismo en el mundo andino. Buenos Aires:
CLACSO, 2002.
- KOSTER,
Rainer. Los Incas: planificación estatal y tecnología. Lima:
Horizonte, 1992.
- MORALES,
Edmundo. The Guinea Pig: Healing, Food, and Ritual in the Andes.
Tucson: University of Arizona Press, 1995.
- UNESCO.
Qhapaq Ñan – Andean Road System. Disponível em: https://whc.unesco.org/en/list/1459
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