A teoria que tornou o rádio possível remonta às equações do
físico escocês James Clerk Maxwell (1831-1879), que em 1873 demonstrou
matematicamente a existência das ondas eletromagnéticas. Essa teoria foi
experimentalmente comprovada por Heinrich Hertz (1857-1894) na década de 1880,
ao gerar e detectar ondas de rádio — chamadas por isso de “ondas hertzianas”.
Curiosamente, Hertz não viu utilidade prática em sua descoberta, chegando a
dizer: “Não creio que as ondas que se propagam sem fios descobertas por mim
venham a ter alguma utilidade prática” (KLOOSTER, 2009).
Mas inventores como Nikola Tesla (1856-1943) discordavam.
Tesla demonstrou sistemas de transmissão e recepção sem fios já em 1893 nos
EUA, antecipando o uso prático das ondas de rádio. De fato, em 1943, a Suprema
Corte dos Estados Unidos reconheceu Tesla como o verdadeiro inventor do rádio
ao invalidar uma patente de Marconi (U.S. Supreme Court, 1943, Marconi
Wireless Telegraph Co. v. United States). Na mesma época, o russo Aleksandr
Popov (1859-1906) e o indiano Jagadish Chandra Bose (1858-1937) também
apresentaram avanços essenciais, como o uso do coesor para detectar sinais.
O coesor, um tubo de limalha metálica que mudava sua
resistência elétrica ao receber ondas eletromagnéticas, foi inventado pelo
físico francês Édouard Branly (1844-1940) em 1890, servindo como base para os
primeiros detectores de rádio. Em 1894, Popov adaptou o coesor, conectando-o a
um alarme, criando um prático detector de tempestades atmosféricas que acabou
sendo um dos primeiros rádios receptores.
O empreendedorismo de Marconi
O diferencial de Marconi foi justamente perceber o potencial
comercial do “telégrafo sem fio”. Ele iniciou seus experimentos em 1894,
transmitindo sinais a partir do jardim de sua casa em Bolonha. Quando o governo
italiano não demonstrou interesse, mudou-se para a Inglaterra, onde em 1896
conseguiu transmitir sinais a 12,9 km de distância. Em 1897, fundou a Wireless
Telegraph & Signal Company (futura Marconi Company) e patenteou seu
sistema.
Marconi foi também um gênio do marketing. Em 1898, conseguiu
repercussão mundial ao instalar um transmissor no iate real do príncipe de
Gales, que estava enfermo, estabelecendo comunicação com a rainha Vitória na
Osborne House. Essa habilidade para publicidade foi crucial para tornar o rádio
um sucesso, como observa J. Klooster: “Marconi tinha as características de um
empreendedor, jeito para atrair publicidade e parecia saber comercializar a
nova tecnologia sem fios” (Icons of Invention, 2009).
O rádio no Titanic: tragédia e lições
A tragédia do RMS Titanic, em 1912, também revela o papel
ambivalente do rádio. O navio, orgulhosamente equipado com dois transmissores
Marconi, deveria receber alertas sobre icebergs. Durante a travessia, seus
operadores — funcionários da Marconi Company — priorizaram mensagens pagas de
passageiros de primeira classe, relegando a segundo plano os repetidos avisos
de gelo. Na noite do desastre, o Californian, navio mais próximo, não atendeu
aos chamados de socorro, pois seu operador estava dormindo e o transmissor
desligado. A história ilustra como a tecnologia, sem protocolos claros e
coordenação internacional, pouco podia fazer para evitar desastres (CHALINE,
2014).
Da telegrafia Morse à radiodifusão
Os primeiros rádios de Marconi eram basicamente
transmissores de centelha para código Morse. Voz e música só viriam bem depois:
as primeiras transmissões experimentais de voz datam de 1906, com Reginald
Fessenden, e as transmissões regulares de programas radiofônicos começaram
apenas na década de 1920. Antes disso, o rádio era quase exclusivamente um
instrumento para navios e empresas de telégrafo.
O impacto foi imenso: em poucas décadas, o rádio transformou
comunicações, guerras e entretenimento. Do ponto de vista técnico, o
desenvolvimento dos circuitos sintonizados por Oliver Lodge e dos detectores
por Braun, Fleming e De Forest ampliou o alcance e a nitidez dos sinais. A
partir daí, o rádio deixou de ser apenas telegrafia sem fio e tornou-se voz,
música e informação — moldando o século XX.
Referências adicionais
- KLOOSTER,
J. Icons of Invention: The Makers of the Modern World from Gutenberg to
Gates. ABC-CLIO, 2009.
- CHALINE,
E. 50 máquinas que mudaram o rumo da história. Tradução de Fabiano
Moraes. Rio de Janeiro: Sextante, 2014.
- U.S.
Supreme Court, 320 U.S. 1 (1943), Marconi Wireless Telegraph Co. v.
United States.
- HONG,
Sungook. Wireless: From Marconi’s Black-box to the Audion. MIT
Press, 2001.
- BROOKS,
John. Telephone: The First Hundred Years. Harper & Row, 1976.
- DYSON,
George. Project Orion: The True Story of the Atomic Spaceship.
Penguin, 2003 (para comparações sobre a inovação técnica e
empreendedorismo científico).
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