Radio Evangélica

segunda-feira, 28 de julho de 2025

A República "Mal-Amada" e o Desvendamento de um Mito

Laurentino Gomes inicia sua análise questionando a "mal-amada" República brasileira, cuja data de celebração, 15 de novembro, carece do prestígio de outras efemérides nacionais. Ele imediatamente desafia a narrativa simplista de uma transição pacífica, um "passeio militar" como muitos livros didáticos a descrevem. Conforme a Introdução e o Capítulo 18, "Os Bestializados", a Proclamação da República não foi um movimento com intensa participação popular, mas sim um golpe militar com escassa adesão civil, um "fato consumado" assistido pela população de forma "bestializada, atônita, surpresa, sem conhecer o que significava". A resenha destaca que a ausência de derramamento de sangue em 1889 contrastou dramaticamente com as guerras civis e conflitos que assolariam o país na primeira fase republicana, como a Revolução Federalista e a Revolta da Armada, cujas cicatrizes custaram dezenas de milhares de vidas.

As Forças por Trás da Mudança de Regime

A obra se aprofunda nos múltiplos fatores que levaram ao colapso da Monarquia. O autor argumenta que a República foi mais resultado do "esgotamento da Monarquia do que do vigor dos ideais e da campanha republicanos" (Introdução).

1. O Imperador Cansado e a Miragem do Império: O Capítulo 5, "Dom Pedro II", e o Capítulo 14, "O Imperador Cansado", oferecem um retrato de um monarca culto e dedicado, mas fragilizado pela idade e pela doença. Sua apatia diante das conspirações iminentes e sua crença ingênua de que "isso não vai dar em nada" contribuíram para a inércia do governo. O Capítulo 4, "A Miragem", discute a contradição entre a imagem idealizada de um "Império tropical" civilizado e europeizado e a realidade de um país agrário, escravocrata, analfabeto e profundamente desigual. As leis e rituais do Império, muitas vezes importados, não se alinhavam à realidade nacional, o que gerava uma instabilidade latente. A Monarquia, vista como um "gigante de pés de barro" (Introdução), não conseguia mais sustentar essa fachada.

2. A Questão Militar e o Ascenso do Positivismo: Laurentino Gomes dedica capítulos cruciais, como o Capítulo 8, "A Mocidade Militar", e o Capítulo 9, "A Chama nos Quartéis", à "Questão Militar". Esta série de conflitos entre o Exército e o governo imperial expôs a fragilidade da autoridade monárquica sobre os quartéis. O autor explora como o sentimento de "desprestígio" e "mal-recompensa" entre os militares, muitos deles veteranos da Guerra do Paraguai, criou um terreno fértil para a insubordinação. Nesse contexto, o positivismo de Auguste Comte, trazido por figuras como o "professor" e tenente-coronel Benjamin Constant (analisado em profundidade no Capítulo 11), ofereceu uma nova ideologia para a "mocidade militar". A busca por "ordem e progresso", a ideia de uma ditadura republicana liderada por uma elite esclarecida, e o desprezo pelas "becas" (civis) foram pilares que moldaram a mentalidade golpista.

3. Os Republicanos Civis e a Ação dos Abolicionistas: O Capítulo 7, "Os Republicanos", revela a diversidade e as contradições do movimento republicano civil. De radicais como Antônio da Silva Jardim, que pregava a execução da família imperial, a moderados que esperavam a morte de Dom Pedro II, a falta de unidade e a fraqueza eleitoral dos republicanos civis são evidentes. Eles, no entanto, souberam usar a imprensa e a retórica para instigar os militares. O Capítulo 12, "Os Abolicionistas", e o Capítulo 13, "A Redentora", destacam o papel crucial da abolição da escravatura. A Lei Áurea, assinada pela Princesa Isabel, embora popular entre a massa, alienou a poderosa aristocracia rural, especialmente os barões do café, que se sentiram traídos e migraram em massa para a causa republicana. A imagem da "Redentora", apesar de honrosa para Isabel, também a tornou um alvo das críticas republicanas, que a viam como excessivamente religiosa e submissa ao marido, o Conde d'Eu.

Os Protagonistas e o Momento do Golpe

Laurentino Gomes humaniza os personagens centrais, desmistificando-os. O "marechal vaidoso", Deodoro da Fonseca (Capítulo 10), é retratado em sua relutância inicial em derrubar a Monarquia, sua saúde debilitada e sua eventual adesão à República mais por ressentimento pessoal contra o governo imperial – especialmente a indicação de Gaspar Silveira Martins – do que por convicção ideológica. A cena em que Deodoro, em seu leito de doente, é convencido a liderar o golpe, revela a fragilidade do processo.

O autor também narra com detalhes o famoso Baile da Ilha Fiscal (Capítulo 15), um evento de grande simbolismo. Essa última grande festa da Monarquia, com sua opulência e despreocupação, serviu como cenário irônico para a conspiração militar que se desenrolava simultaneamente. A desorganização e a superficialidade da corte, contrastando com a determinação dos conspiradores, são ressaltadas.

O Capítulo 16, "A Queda", descreve a falta de resistência por parte do governo imperial, a incredulidade de Dom Pedro II e a rapidez com que o poder foi tomado. O Brasil, de repente, encontrou-se em um vácuo político, sem monarquia e ainda sem uma República consolidada. O Capítulo 17, "O Adeus", relata a melancólica partida da família imperial para o exílio, um momento de dignidade e tristeza que encerrou um capítulo de quase sete décadas da história brasileira.

O Início Turbulento e as Marcas Duradouras

Os Capítulos 19 ("Ordem e Progresso") e 20 ("O Difícil Começo") mostram os esforços do novo regime para consolidar-se e criar uma nova identidade nacional, rebatizando ruas e heróis, elevando Tiradentes à condição de mártir republicano. No entanto, o otimismo inicial deu lugar a um período de grande instabilidade. O "Encilhamento" (Capítulo 21), uma bolha especulativa fomentada pelas políticas financeiras de Rui Barbosa, causou caos econômico e inflação, expondo a ingenuidade dos novos líderes.

O "Marechal de Ferro", Floriano Peixoto (Capítulo 22), emerge como a figura central da consolidação republicana. Sua postura autoritária, sua perseguição implacável a opositores e a violência das guerras civis (como a Revolução Federalista, detalhada no Capítulo 23, "Paixão e Morte", com suas brutais "degolas") revelam o alto preço pago pela estabilização do regime. A "República da Espada" impôs a ordem à força, distanciando-se do ideal democrático e popular.

Finalmente, o Capítulo 24, "O Desafio", aborda a transição para o governo civil com Prudente de Morais. A obra conclui que, apesar das promessas e do ideal de uma República inclusiva, o regime consolidado na "República Velha" manteve muitas das características oligárquicas e excludentes do Império, apenas mudando os nomes dos atores. A "política dos governadores" e o "coronelismo" perpetuaram um sistema de poder concentrado e distante do povo. Laurentino Gomes deixa o leitor com a reflexão de que a verdadeira "República do povo" só começaria a tomar forma muito tempo depois, com movimentos como as "Diretas Já", um desafio que os brasileiros ainda enfrentam.

Considerações Finais

"1889" é uma obra-prima de narrativa histórica. Laurentino Gomes demonstra maestria em tecer uma tapeçaria rica em detalhes, utilizando uma vasta gama de fontes primárias e secundárias, muitas das quais são referenciadas na sua extensa bibliografia (com citações de 300 a 402 no seu material). Sua capacidade de apresentar múltiplas perspectivas, desconstruir mitos e expor as complexidades e contradições do período torna a leitura instigante. O estilo jornalístico, com anedotas e descrições vívidas, cativa o leitor sem comprometer a profundidade da análise.

Para quem busca expandir seus conhecimentos e ter acesso a análises aprofundadas sobre a história do Brasil, a leitura de "1889" é especialmente valiosa. Ela oferece uma perspectiva aprofundada sobre as raízes de nossa formação, abordando temas que ressoam diretamente com o cenário político e social atual. A obra é um convite à reflexão crítica sobre o passado para melhor compreender o presente e, talvez, vislumbrar caminhos para um futuro mais equitativo. É uma jornada histórica que vale a pena ser empreendida.

 

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