Instituições da República Romana
O sistema político republicano era sustentado por um
conjunto de instituições que, em teoria, visavam equilibrar o poder e evitar a
tirania.
Magistraturas
As magistraturas eram cargos eletivos e temporários,
geralmente anuais, que detinham o poder executivo. As mais importantes
incluíam:
- Cônsules:
Dois cônsules eram eleitos anualmente, detendo o poder supremo (imperium),
incluindo o comando militar e a administração civil. Agiam como chefes de
estado e exército, com o poder de vetar as decisões um do outro.
- Pretores:
Responsáveis pela administração da justiça, os pretores também podiam
comandar exércitos e governar províncias.
- Censores:
Eleitos a cada cinco anos, os censores eram encarregados do censo da
população, da supervisão da moral pública e da administração das finanças
estatais.
- Edis:
Responsáveis pela manutenção da ordem pública, organização de jogos e
festivais, e supervisão dos mercados.
- Questores:
Atuavam como assistentes financeiros dos cônsules e administradores do
tesouro público.
- Tribunos
da Plebe: Criados para proteger os interesses dos plebeus, os tribunos
tinham o poder de vetar atos de outros magistrados e de propor leis. Sua
pessoa era considerada sacrossanta.
Assembleias
A participação popular ocorria através de diversas
assembleias, cada uma com funções específicas e composição variável:
- Comícios
Centuriatos (Comitia Centuriata): A principal assembleia eleitoral,
responsável pela eleição dos cônsules, pretores e censores, além de votar
leis e decidir sobre a guerra e a paz. Sua organização baseava-se em
"centúrias" militares, favorecendo as classes mais ricas, que
possuíam mais centúrias e votavam primeiro.
- Comícios
Trebutos (Comitia Tributa): Organizados por tribos geográficas, esta
assembleia elegia os édis e questores, e votava algumas leis. Embora mais
igualitária que os Comícios Centuriatos, a distribuição das tribos ainda
podia ter nuances que favoreciam certos grupos.
- Concílio
da Plebe (Concilium Plebis): Exclusivo para os plebeus, elegia os
tribunos da plebe e os édis plebeus. Seus decretos, chamados plebiscitos,
inicialmente só obrigavam os plebeus, mas com o tempo (especialmente após
a Lei Hortênsia em 287 a.C.) tornaram-se vinculativos para todos os cidadãos.
Senado
O Senado era a instituição mais prestigiosa e
influente da República. Composto inicialmente por 300 membros, em sua maioria
ex-magistrados, o Senado detinha uma vasta autoridade consultiva. Suas
recomendações (senatus consulta) tinham um peso quase de lei, e o Senado
controlava as finanças públicas, a política externa e a supervisão religiosa.
Embora não fosse uma assembleia eleita diretamente, sua composição de
aristocratas e sua experiência política o tornavam o verdadeiro centro do poder
romano.
A Luta Entre Patrícios e Plebeus
A história da República Romana nos primeiros séculos foi
marcada por um intenso conflito social conhecido como a Luta das Ordens.
De um lado, estavam os patrícios, uma elite hereditária que detinha a
maior parte da riqueza, terras e acesso às magistraturas e ao sacerdócio. Do
outro, os plebeus, a vasta maioria da população, composta por
agricultores, artesãos e comerciantes, que inicialmente não tinham direitos
políticos plenos e sofriam com a servidão por dívidas e a falta de proteção
legal.
Essa luta se desenrolou por aproximadamente dois séculos (c.
500-287 a.C.) e foi crucial para a formação da estrutura republicana. As
principais demandas plebeias incluíam:
- Acesso
às magistraturas: Os plebeus reivindicavam o direito de ocupar cargos
políticos, especialmente o consulado.
- Fim
da servidão por dívidas: A prática de um devedor se tornar escravo de
seu credor era uma fonte constante de exploração e injustiça.
- Codificação
das leis: A falta de leis escritas permitia aos patrícios manipular a
justiça em seu benefício. A Lei das Doze Tábuas (450 a.C.) foi um marco
importante nesse sentido.
- Direitos
de casamento misto (conubium): Inicialmente proibido, o casamento
entre patrícios e plebeus foi legalizado, o que contribuiu para a
integração social.
- Força
vinculante dos plebiscitos: A obtenção da Lei Hortênsia (287 a.C.),
que tornou os plebiscitos obrigatórios para todos os cidadãos, foi o ápice
dessa luta, marcando o fim do conflito das ordens.
O Governo do Povo? Uma Análise Crítica
Apesar das conquistas plebeias e da estrutura de
assembleias, é questionável se a República Romana pode ser plenamente descrita
como um "governo do povo" no sentido moderno da democracia.
- Desigualdade
Intrínseca: A distribuição de poder e riqueza permaneceu desigual.
Mesmo com o acesso às magistraturas, a influência das famílias patrícias e
da nova nobreza plebeia (formada pelas famílias plebeias enriquecidas e
politicamente ativas) era preponderante.
- Domínio
do Senado: O Senado, dominado pela aristocracia, manteve-se como o
centro decisório, influenciando todas as esferas do governo.
- Voto
Censorial: O sistema de votação nos Comícios Centuriatos, que dava
maior peso aos mais ricos, limitava a representatividade real das classes
populares.
- Ausência
de Cidadania Universal: A cidadania romana era restrita, e grande
parte da população no território romano, como mulheres, escravos e
estrangeiros, não possuía direitos políticos.
Em conclusão, a República Romana foi um sistema inovador
para sua época, que implementou importantes princípios de governança, como a
limitação do poder, a representação e a participação cívica através das
assembleias e magistraturas. No entanto, a constante luta entre patrícios e
plebeus e a persistência de estruturas que favoreciam as elites demonstram que,
embora tenha havido progressos em direção a uma maior inclusão, a República
Romana estava longe de ser um governo verdadeiramente igualitário ou plenamente
"do povo". Sua complexidade e suas contradições internas foram,
paradoxalmente, elementos que contribuíram tanto para sua força quanto para os
desafios que, eventualmente, levariam ao seu declínio e à ascensão do Império.
Referências Bibliográficas:
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