A Monarquia Absoluta e o Poder do Sultão
O sistema político de Brunei é definido pela sua
constituição de 1959 e, mais fundamentalmente, pela ideologia nacional
conhecida como Melayu Islam Beraja (MIB), ou Monarquia Malaia Islâmica.
Este conceito é o pilar que sustenta toda a governança, cultura e vida social
do país, estabelecendo a supremacia da cultura malaia, da religião islâmica e
da monarquia como instituição central e inquestionável.
O atual Sultão, Hassanal Bolkiah, está no trono desde
1967 e é um dos monarcas com o reinado mais longo do mundo. Em Brunei, ele não
é apenas o Chefe de Estado; ele é também o Chefe de Governo. Sua autoridade é
praticamente ilimitada. Para ilustrar a centralização de poder, o Sultão ocupa
simultaneamente os seguintes cargos:
- Primeiro-Ministro
- Ministro
da Defesa
- Ministro
das Finanças e Economia
- Ministro
dos Negócios Estrangeiros
Essa acumulação de funções críticas significa que todas as
decisões estratégicas, desde a política externa e orçamentária até a segurança
nacional, passam diretamente por ele. O poder do Sultão é exercido através de
decretos, que têm força de lei e não necessitam de aprovação de um corpo
legislativo para serem implementados.
A Intervenção do Sultão na Prática
A intervenção do Sultão é total e abrange todos os aspectos
da vida pública. Alguns exemplos práticos incluem:
- Legislação
e Justiça: O Sultão tem a palavra final sobre todas as leis. Um dos
exemplos mais notórios internacionalmente foi a implementação faseada de
um rigoroso código penal baseado na Lei Sharia, que culminou em 2019. Essa
decisão, tomada por decreto, alterou profundamente o sistema judicial do
país, demonstrando que a vontade do monarca se sobrepõe a qualquer outra
consideração.
- Economia:
A riqueza de Brunei, proveniente do petróleo e gás natural, é gerida pelo
Estado sob a autoridade direta do Sultão. Ele supervisiona a agência de
investimentos do país (Brunei Investment Agency - BIA) e delineia os
planos de diversificação econômica, como o "Wawasan Brunei 2035"
(Visão Brunei 2035).
- Administração
Pública: Todos os ministros e altos funcionários do governo são
nomeados pelo Sultão e servem sob sua aprovação. Não há eleições para
cargos executivos, garantindo que todo o aparato estatal responda
diretamente a ele.
O Papel do Parlamento: O Conselho Legislativo
Apesar da natureza absoluta da monarquia, existe um corpo
que se assemelha a um parlamento: o Conselho Legislativo (Majlis Mesyuarat
Negara). No entanto, sua função é muito diferente daquela encontrada em
democracias.
- Composição:
O Conselho é composto por membros nomeados diretamente pelo Sultão. Inclui
ministros do gabinete, detentores de títulos tradicionais, empresários e
representantes distritais. Não há membros eleitos pelo povo.
- Função:
O seu papel é primariamente consultivo e deliberativo. O Conselho
se reúne anualmente para discutir o orçamento nacional e outras leis
propostas pelo governo. Contudo, ele não possui poder de veto e não pode
iniciar legislação de forma independente. Sua função é oferecer conselhos
e feedback ao Sultão, que retém a autoridade final para aprovar, rejeitar
ou modificar qualquer proposta.
Em essência, o Conselho Legislativo serve como um fórum para
que o governo explique suas políticas e para que uma elite selecionada possa
debater questões nacionais, mas não age como um contrapeso ao poder executivo.
O Sultão pode dissolvê-lo ou ignorar suas recomendações a qualquer momento.
Conclusão: Estabilidade em Troca de Soberania Popular
A política em Brunei opera sob um contrato social implícito:
a população desfruta de um elevado padrão de vida, educação e saúde gratuitas,
ausência de imposto de renda e uma notável estabilidade social. Em troca, a
soberania política permanece firmemente nas mãos do Sultão. A ideologia MIB
reforça a legitimidade desse sistema, apresentando a monarquia não apenas como
uma forma de governo, mas como a guardiã da identidade e dos valores da nação.
Portanto, a intervenção do Sultão não é vista como uma anomalia, mas como o
funcionamento natural e esperado do Estado de Brunei.
Referências Bibliográficas
- SAUNDERS,
Graham. A History of Brunei. Routledge, 2002.
- GUNN,
Geoffrey C. New World Hegemony in the Malay World. The Red Sea
Press, 2000. (Oferece contexto sobre a dinâmica política da região,
incluindo Brunei).
- UJAN,
T. A. The Brunei Constitution of 1959: An Inside History. Brunei
Press, 2009.
- BRAIGHETTI,
D. Southeast Asian Politics. Palgrave Macmillan, 2017. (Capítulos
sobre sistemas políticos tradicionais e monarquias na região).
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