Contexto Histórico: Da Fundação à Independência
A monarquia de Lesoto tem suas raízes no início do século
XIX, com o Rei Moshoeshoe I. Ele foi uma figura fundamental que unificou as
diversas tribos Basotho para se defenderem das ameaças externas, notadamente os
zulus e os bôeres. Sua liderança diplomática e estratégica garantiu a
sobrevivência do povo Basotho, estabelecendo as fundações do Estado moderno.
Para se proteger da anexação pelos sul-africanos, Moshoeshoe I buscou a
proteção da Coroa Britânica, e em 1868, o território tornou-se o protetorado da
Basutolândia.
Durante o período colonial, a autoridade do monarca foi
progressivamente erodida, transferindo-se para a administração britânica. Com a
independência em 1966, Lesoto adotou uma constituição que formalizava o papel
do Rei como um monarca constitucional, limitando seu poder em favor de um
governo democraticamente eleito, liderado por um Primeiro-Ministro.
A Constituição de 1993 e a Monarquia Constitucional
A atual Constituição de Lesoto, promulgada em 1993, define
claramente os limites e as funções do monarca. O Rei é o Chefe de Estado, mas o
poder executivo é investido no Gabinete, liderado pelo Primeiro-Ministro. As
principais características de seu papel são:
- Símbolo
de Unidade Nacional: A função mais crucial do Rei é personificar a
identidade e a unidade do povo Basotho. Ele transcende as divisões
políticas e partidárias, servindo como um ponto de confluência para todos
os cidadãos, independentemente de afiliação política.
- Funções
Cerimoniais: O Rei desempenha deveres cerimoniais essenciais, como a
abertura das sessões do Parlamento, a acreditação de embaixadores e a
concessão de honrarias. Essas ações conferem legitimidade e solenidade aos
atos do Estado.
- Aconselhamento
e Neutralidade: O Rei deve agir de acordo com o conselho do
Primeiro-Ministro ou de outros órgãos estatais, como o Conselho de Estado.
A Constituição proíbe explicitamente o monarca de se envolver ativamente
na política ou de expressar publicamente opiniões partidárias. Sua
neutralidade é fundamental para manter a integridade do cargo.
A sucessão ao trono é determinada pelo Colégio de Chefes,
conforme os preceitos do direito consuetudinário Basotho. Este órgão também tem
o poder de remover um monarca, garantindo que o Rei atue dentro dos limites
estabelecidos.
Desafios e a Relevância Contemporânea
A história pós-independência de Lesoto foi marcada por
instabilidade política, incluindo golpes de Estado e crises governamentais. Em
vários momentos, a monarquia foi arrastada para o centro dessas disputas. No
entanto, o Rei Letsie III tem sido amplamente visto como uma força moderadora e
um mediador discreto durante períodos de tensão.
Em uma nação onde a política pode ser polarizadora, a
monarquia oferece um senso de continuidade, tradição e estabilidade. O Rei
continua a ser uma figura altamente respeitada, atuando como o guardião da
cultura e das tradições Basotho, um papel que fortalece a coesão social e o
orgulho nacional.
Conclusão
A monarquia de Lesoto exemplifica a adaptação de uma
instituição tradicional às exigências de um Estado democrático moderno. Embora
desprovido de poder político direto, o Rei Letsie III exerce uma influência
significativa como o principal símbolo da unidade e identidade nacional. Seu
papel cerimonial e sua neutralidade política são essenciais para a estabilidade
e a coesão do "Reino no Céu", garantindo que a Coroa permaneça como
um farol de continuidade em meio às complexidades da vida política.
Referências Bibliográficas
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