Este artigo explora as origens, a organização e as
particularidades da monarquia do Catar, um sistema onde a tradição e a
modernidade se encontram de maneira complexa.
A Origem e a Consolidação da Casa de Thani
A história do Catar moderno está intrinsecamente ligada à
ascensão da Casa de Thani. A família migrou para a península do Catar no
século XVIII e, em meados do século XIX, sob a liderança de Sheikh Mohammed
bin Thani, consolidou seu poder sobre as diversas tribos da região.
O reconhecimento formal de sua autoridade veio através de um
tratado assinado com o Império Britânico em 1868, que efetivamente separou o
Catar do Bahrein e estabeleceu a dinastia Al Thani como sua casa governante.
Essa aliança com os britânicos garantiu proteção e estabilidade, permitindo que
a família solidificasse seu domínio internamente, um padrão visto em outras
monarquias do Golfo.
A Estrutura da Monarquia: O Emir e o Poder Absoluto
O Catar é oficialmente uma monarquia absolutista e
hereditária. O chefe de Estado e de Governo é o Emir, título que
concentra poderes executivos, legislativos e judiciais.
- O
Emir: Atualmente, o cargo é ocupado por Sheikh Tamim bin Hamad Al
Thani, que ascendeu ao trono em 2013 após a abdicação de seu pai. O
Emir nomeia o primeiro-ministro (cargo que muitas vezes acumula), os
ministros e os membros dos principais conselhos do país. Suas decisões,
emitidas por decretos (chamados decretos emirais), têm força de
lei.
- A
Sucessão: A sucessão ao trono é hereditária dentro da família Al
Thani. Embora a Constituição de 2003 estipule que o poder é passado de pai
para filho, o Emir reinante designa um herdeiro aparente (Heir Apparent).
A decisão final sobre a sucessão, contudo, repousa sobre a consulta e o
consenso dentro da família governante.
As Instituições Políticas: Entre a Tradição e a
Modernização
Apesar da concentração de poder no Emir, o Catar possui
instituições que auxiliam na administração do Estado, ainda que com poderes
limitados.
1. Conselho de Ministros
O Gabinete, ou Conselho de Ministros, é o principal órgão
executivo do país. Seus membros são nomeados diretamente pelo Emir e são
responsáveis por implementar as políticas governamentais e administrar os
ministérios.
2. Conselho Shura (Majlis al-Shura)
Originalmente um órgão puramente consultivo e nomeado, o
Conselho Shura passou por uma reforma histórica. Em outubro de 2021, o Catar
realizou suas primeiras eleições legislativas para escolher 30 dos 45 membros
do conselho (os outros 15 continuam sendo nomeados pelo Emir). Suas funções
incluem:
- Debater
e propor leis (que precisam da sanção do Emir para entrar em vigor).
- Aprovar
o orçamento nacional.
- Exercer
um controle limitado sobre os ministros.
Embora seja um passo em direção à participação política, o
poder final de decisão permanece firmemente nas mãos do Emir.
3. Sistema Jurídico
O sistema legal do Catar é dualista, refletindo a mistura de
tradição e modernidade. Ele combina o direito civil, baseado em códigos, com a lei
islâmica (Sharia). A Sharia é a principal fonte de legislação,
especialmente em questões de direito familiar e pessoal, enquanto o direito
civil rege áreas como o comércio e as finanças. Os juízes são nomeados pelo
Emir, garantindo seu controle sobre o poder judiciário.
A Base do Poder: Riqueza Energética e Diplomacia
A estabilidade e a longevidade da monarquia Al Thani não
podem ser compreendidas sem analisar suas duas principais colunas de
sustentação:
1
Riqueza de Hidrocarbonetos: O Catar
possui as terceiras maiores reservas de gás natural do mundo. A receita gerada
pela exportação de gás e petróleo financia um generoso estado de bem-estar
social para seus cidadãos, incluindo educação, saúde e moradia gratuitas ou
subsidiadas. Essa distribuição de riqueza ajuda a garantir a lealdade da
população e a estabilidade política interna.
2
Política Externa Independente: O Catar
utiliza sua riqueza para projetar poder através de uma política externa
assertiva. A criação da rede de notícias Al Jazeera, a mediação de
conflitos regionais e os investimentos estratégicos em todo o mundo conferem ao
país uma influência desproporcional ao seu tamanho.
Conclusão
A monarquia do Catar é um sistema robusto, centralizado na
figura do Emir e na dinastia Al Thani. Sustentada por uma vasta riqueza
energética e uma diplomacia habilidosa, ela tem navegado pelos desafios da
modernização mantendo um controle político firme. As recentes eleições para o
Conselho Shura indicam uma lenta abertura, mas o núcleo do poder permanece
inalterado, firmemente ancorado na tradição e na autoridade da família
governante.
Referências Bibliográficas
- FROMHERZ,
Allen. Qatar: A Modern History. Washington, D.C.: Georgetown
University Press, 2017.
- ULRICHSEN,
Kristian Coates. Qatar and the Gulf Crisis. Oxford: Oxford
University Press, 2020.
- KAMRAVA,
Mehran. Qatar: Small State, Big Politics. Ithaca: Cornell
University Press, 2015.
- Constitution
of the State of Qatar, 2003. (Documento oficial que estabelece a estrutura
de governo e o papel do Emir). Disponível em portais governamentais e
bancos de dados jurídicos internacionais.
Nenhum comentário:
Postar um comentário