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terça-feira, 4 de março de 2025

Carlota Joaquina de Bourbon: Entre o Poder e a Controvérsia na História Luso-Brasileira

Carlota Joaquina de Bourbon (1775–1830), rainha consorte de Portugal, figura como uma das personagens mais controversas da história luso-brasileira. Filha do rei Carlos IV da Espanha, seu casamento com Dom João VI foi marcado por interesses políticos e conflitos pessoais. Neste artigo, busca-se analisar o papel político de Carlota Joaquina, suas articulações durante o período da transferência da corte portuguesa ao Brasil (1808) e seu legado histórico, frequentemente associado à intriga e à resistência às mudanças liberais. A pesquisa fundamenta-se em fontes históricas e na historiografia recente que busca revisitar sua atuação além dos estereótipos.

Introdução

Carlota Joaquina de Bourbon é lembrada na história como uma figura polêmica, muitas vezes retratada com adjetivos depreciativos como "ambiciosa" e "conspiradora". Entretanto, novas abordagens historiográficas apontam para a necessidade de uma reavaliação crítica de sua trajetória, destacando sua participação ativa na política da época. Neste artigo, analisamos sua influência política, suas pretensões dinásticas e o impacto de sua presença na corte portuguesa no Brasil.

Contexto Histórico e Biográfico

Carlota Joaquina nasceu em 25 de abril de 1775, na Espanha. Aos dez anos foi prometida em casamento a Dom João, então príncipe herdeiro de Portugal, como parte de uma aliança política entre os reinos ibéricos. Casou-se oficialmente em 1785, numa união que, desde o início, demonstrou ser turbulenta, tanto no aspecto pessoal quanto político.

Durante a transferência da corte portuguesa para o Brasil, em 1808, devido à invasão napoleônica na Península Ibérica, Carlota Joaquina desempenhou um papel relevante, principalmente ao tentar reivindicar para si o governo das possessões espanholas na América do Sul, alegando a ilegitimidade do domínio francês na Espanha.

O Carlotismo: Ambições e Limites

O movimento conhecido como "Carlotismo" refere-se aos esforços de Carlota Joaquina em assumir o controle sobre territórios espanhóis na América, utilizando como justificativa sua condição de filha do rei deposto e esposa do regente de Portugal. Ela tentou legitimar sua pretensão ao trono do Rio da Prata (atual Argentina, Uruguai e Paraguai), mas encontrou resistência tanto dos espanhóis quanto dos próprios portugueses e brasileiros, que temiam envolver-se em conflitos externos.

Embora não tenha obtido sucesso efetivo, o Carlostismo revelou a disposição política de Carlota Joaquina de atuar além do papel cerimonial esperado das mulheres da monarquia, inserindo-se nos debates geopolíticos do início do século XIX.

Carlota Joaquina e o Absolutismo

Carlota Joaquina também é lembrada por sua firme oposição ao movimento liberal em Portugal. Após a Revolução Liberal do Porto (1820), que estabeleceu a Constituição de 1822, Carlota posicionou-se ao lado dos setores mais conservadores, defendendo a restauração do absolutismo. Sua influência foi crucial durante as tensões políticas que envolveram a volta da corte a Portugal em 1821 e as disputas internas na família real.

Morte e Legado

Carlota Joaquina morreu em 7 de janeiro de 1830, em Queluz, Portugal. Após sua morte, sua imagem foi consolidada como a de uma figura antagônica às transformações políticas que marcaram a transição do Antigo Regime para o constitucionalismo. Contudo, estudos recentes propõem uma leitura mais complexa de sua trajetória, reconhecendo-a como uma mulher que soube articular poder dentro das limitações de seu tempo.

Considerações Finais

Carlota Joaquina de Bourbon ultrapassou os limites tradicionais do papel feminino na monarquia, agindo como agente político em momentos decisivos da história luso-brasileira. Ao reavaliar sua atuação sem os preconceitos consolidados pela historiografia tradicional, podemos compreender melhor as dinâmicas de poder na corte portuguesa e as relações entre Portugal, Espanha e Brasil no início do século XIX.

 

Referências

  • ARRUDA, José Jobson de Andrade. O Brasil no Contexto da América Latina: Século XIX. São Paulo: Ática, 1993.
  • BARMAN, Roderick J. Brazil: The Forging of a Nation, 1798–1852. Stanford: Stanford University Press, 1988.
  • COSTA, Fernando Dores. Carlota Joaquina e o Carlostismo: Ambições e Limites. Revista Brasileira de História, v. 24, n. 47, p. 11-38, 2004.
  • LYRA, Maria de Lourdes Viana. A utopia do poderoso império: Portugal e Brasil: 1798-1822. Rio de Janeiro: Sette Letras, 1994.
  • SARAIVA, José Hermano. História Concisa de Portugal. Lisboa: Publicações Europa-América, 1993.

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