Espécie de mantra dos membros da equipe econômica em
Brasília para tentar solucionar o nó nas contas públicas, o “ajuste fiscal”
virou realidade nos lares brasileiros. Em meio ao aumento do desemprego, das
dívidas e da inflação, os consumidores apertaram os cintos no ano passado e
devem continuar cortando gastos este ano, de acordo com especialistas.
“As contas de consumo aumentam, a alimentação aumenta, a pensão dos filhos
também precisa ser reajustada todo ano. Ainda estou às voltas com as dívidas da
obra, então tenho de segurar mais (os gastos)”, conta o gerente de marketing
Affonso Nunes, 49 anos, que vive no Rio de Janeiro. A obra é o novo apartamento,
montado há dois anos, que lhe rendeu dois financiamentos, um para pagar o
imóvel e outro para realizar reformas.
Embora os juros tenham subido entre 2013 e 2015, as parcelas pagas por Nunes
não aumentaram de valor. Mas as outras contas ficaram mais caras, e o jeito foi
eliminar gastos para não ficar inadimplente. Uma das vítimas foi o
ar-condicionado, que foi substituído por um ventilador depois de a conta de luz
ter registrado um aumento de 51% apenas no ano passado.
“Quando entrou a bandeira vermelha, a conta subiu para R$ 400. Comprei um
grande circulador de ar e passei a programar o ar-condicionado para que
desligasse uma ou duas horas depois de dormir. Consegui diminuir a conta quase
pela metade”, diz.
Poupança
No ano passado, 91% dos consumidores afirmaram ter reduzido os gastos em
relação a 2014, segundo pesquisa do Instituto Data Popular. Só que, para
alguns, a medida não foi suficiente. Mesmo com a contenção de despesas, 15,7%
afirmaram em janeiro de 2016 que usaram recursos da poupança para cobrir
despesas correntes, maior porcentual em mais de dez anos de Sondagem do
Consumidor da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Não à toa, a poupança teve um
saque líquido (o quanto as retiradas superaram os depósitos) recorde de R$
53,57 bilhões em 2015.
O superintendente adjunto de Ciclos Econômicos da FGV, Aloisio Campelo, explica
que o avanço do indicador de uso da poupança foi surpreendente a partir de
janeiro de 2014. “Em 2015, a proporção ultrapassou os 10% e foi gradualmente
atingindo novos recordes. Em novembro e dezembro houve alguma acomodação, mas,
como a situação financeira das famílias continua piorando, temos de esperar um
pouco para confirmar uma mudança de tendência.”
Para o especialista em finanças pessoais Roberto Zentgraf, professor do Ibmec e
da FGV, a queda no consumo vai continuar. “As pessoas não estão encontrando uma
forma de aumentar a receita. Pelo contrário, tem consultor sem consultoria para
prestar, professor sem aula para dar. Então, as famílias têm mesmo de fazer um
ajuste fiscal.”
O jeito, segundo o especialista, é cortar supérfluos e revisar despesas
desnecessárias antes de sacrificar o bem-estar.
Fonte: Estadão / Parlamento PB
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