Seu governo encerrou um período de caos e fragmentação, mas
ao custo da criação de um regime mais autocrático e burocrático, no qual
o imperador tornou-se um senhor absoluto (dominus), e não mais o “primeiro
cidadão” (princeps).
A Instituição da Tetrarquia
A medida mais notável de Diocleciano foi a criação da Tetrarquia,
um sistema político que dividia o poder imperial entre quatro governantes. O
objetivo era enfrentar dois problemas crônicos: a vastidão do território romano
e as ameaças constantes nas fronteiras.
Em 286, Diocleciano nomeou Maximiano como
co-imperador, concedendo-lhe o título de Augusto e o controle do Ocidente,
enquanto mantinha para si o Oriente. Em 293, o sistema foi ampliado: cada
Augusto passou a ter um César, ou seja, um sucessor designado. Assim,
Diocleciano escolheu Galério, e Maximiano, Constâncio Cloro.
O modelo estabeleceu quatro centros de poder,
garantindo respostas mais rápidas a invasões e rebeliões, além de tentar
resolver o problema da sucessão imperial. Embora tenha funcionado bem enquanto
Diocleciano estava vivo, o sistema acabou ruindo após sua abdicação, revelando
o quanto sua autoridade pessoal era o verdadeiro eixo da estabilidade.
Reformas Administrativas e Econômicas
A reorganização do império não se limitou à política.
Diocleciano promoveu mudanças estruturais na administração e nas finanças
públicas, com o objetivo de sustentar o exército e a máquina estatal.
- Reorganização
Provincial
As antigas províncias foram subdivididas em unidades menores e agrupadas em doze dioceses, administradas por vigários. Isso enfraqueceu governadores locais, reduzindo o risco de revoltas, e tornou a cobrança de impostos mais eficiente. - Reforma
Fiscal
O sistema capitatio-iugatio combinava tributos sobre a terra (iugum) e sobre o trabalho (caput). Essa inovação buscava criar um modelo mais justo e previsível de arrecadação, essencial para manter o exército e o funcionalismo. - Reforma
Monetária e o Édito Máximo
Para conter a inflação, Diocleciano introduziu novas moedas, como o argenteus (de prata) e o follis (de bronze). Em 301, promulgou o famoso Édito sobre os Preços Máximos, que fixava valores para mais de mil produtos e serviços. A tentativa fracassou, pois muitos comerciantes deixaram de vender, impulsionando o mercado negro. Mesmo assim, a medida revela o esforço do imperador em restaurar a economia e o controle estatal.
Reformas Militares
A segurança do império foi uma das maiores preocupações de
Diocleciano. Ele ampliou e reorganizou o exército, criando uma estrutura de
defesa em profundidade, composta por dois grupos principais:
- Limitanei:
soldados fixos nas fronteiras (limes), encarregados de retardar
invasões e proteger vilas e rotas comerciais.
- Comitatenses:
tropas móveis e de elite, localizadas no interior do império, prontas para
agir rapidamente onde a ameaça fosse maior.
Essas reformas garantiram maior flexibilidade militar e
foram fundamentais para a sobrevivência do império nas décadas seguintes.
A Grande Perseguição aos Cristãos
O episódio mais sombrio de seu governo foi a chamada Grande
Perseguição (303–311 d.C.). Diocleciano acreditava que a unidade do império
dependia da fidelidade aos deuses tradicionais e à figura divina do imperador.
Assim, considerava o cristianismo, com seu monoteísmo intransigente, uma ameaça
à ordem pública.
Foram emitidos éditos que ordenavam a destruição de igrejas,
a queima das Escrituras e a prisão do clero. A repressão foi intensa,
especialmente no Oriente, mas falhou em erradicar a fé cristã — que,
ironicamente, sairia fortalecida e se tornaria a religião oficial do império
poucas décadas depois.
Abdicação e Legado
Em um gesto inédito na história romana, Diocleciano abdicou
voluntariamente do poder em 1º de maio de 305, obrigando Maximiano a fazer
o mesmo. Retirou-se para seu majestoso palácio em Spalatum (atual Split,
na Croácia), onde viveu até sua morte.
Seu legado é duplo e contraditório.
Por um lado, salvou o Império Romano do colapso, restaurando a ordem e
criando bases duradouras para o Império Bizantino. Por outro, instituiu um
regime autoritário e pesado, em que a burocracia e os impostos sufocavam os
cidadãos.
Diocleciano foi, portanto, tanto o salvador quanto o recriador
de Roma — o homem que transformou o império em uma nova entidade política, mais
estável, mas também mais distante do ideal republicano de seus antepassados.
Para saber mais
- Enciclopédia
Britannica – Diocletian
- World
History Encyclopedia – Tetrarchy
- UNESCO – Palácio de Diocleciano
em Split
- Leia
também em nosso blog: História
Antiga
Referências Bibliográficas
BARNES, Timothy D. The New Empire of Diocletian and
Constantine. Harvard University Press, 1982.
CORCORAN, Simon. The Empire of the Tetrarchs: Imperial Pronouncements and
Government, AD 284-324. Oxford: Clarendon Press, 2000.
POTTER, David S. The Roman Empire at Bay, AD 180-395. London: Routledge,
2014.
SOUTHERN, Pat. The Roman Empire from Severus to Constantine. London:
Routledge, 2001.
WILLIAMS, Stephen. Diocletian and the Roman Recovery. London: Routledge,
1996.
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