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sexta-feira, 17 de outubro de 2025

A Força do Cordel: Como a Literatura Popular Resiste e Preserva a Identidade Cultural Brasileira

Em meio às prateleiras digitais e ao fluxo incessante de informações da era moderna, uma forma de arte genuinamente brasileira resiste com vigor: a literatura de cordel.

Pendurados em seus tradicionais barbantes — ou cordéis, daí o nome — os folhetos de capas coloridas e gravuras rústicas são muito mais do que simples histórias em rima; representam um pilar fundamental na preservação e difusão da cultura popular do Brasil.

A força do cordel reside em sua capacidade de ser, simultaneamente, espelho e cronista do povo. Nascido da tradição oral dos trovadores medievais e adaptado com maestria no sertão nordestino, o cordel se tornou o jornal, a escola e o entretenimento de comunidades inteiras, especialmente em uma época de acesso restrito à educação formal.

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Entenda como as narrativas moldam identidades e preservam valores — tanto nos mitos antigos quanto no cordel brasileiro.

 

O Cordel como Registro Histórico e Social

Antes da popularização do rádio e da televisão, eram os poetas cordelistas que narravam os grandes acontecimentos — da política nacional aos dramas do sertão.
As aventuras de Lampião, os milagres de Padre Cícero, as secas e as transformações sociais eram meticulosamente versadas em sextilhas e setilhas. Essa função de jornalismo popular não apenas informava, mas também interpretava a realidade sob a ótica do homem comum.

Assim, o cordel é um arquivo vivo da memória coletiva brasileira — um testemunho em versos da vida, da fé e da resistência nordestina.

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Culturas distintas, mas com o mesmo propósito: eternizar saberes por meio da arte.

 

A Transmissão de Saberes e Valores

A literatura de cordel funciona como um potente vetor de transmissão de conhecimento e valores.
Por meio de narrativas que mesclam o real e o fantástico, ensinam-se lições de moral, ética e sabedoria popular.
Os desafios entre cantadores e as fábulas de animais perpetuam um código de valores que molda o caráter de gerações.

A oralidade, marca essencial do cordel, reforça esse papel pedagógico e afetivo: os versos declamados em feiras e praças públicas criam laços comunitários e mantêm viva a voz do povo.

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Assim como o cordel, o texto bíblico também ecoa coragem, fé e superação diante da adversidade.

 

Uma Estética Única: A Palavra e a Imagem

Não se pode falar de cordel sem mencionar a xilogravura, técnica de impressão em madeira que ilustra as capas dos folhetos.
Essas imagens de traços fortes e expressivos criam uma identidade visual inconfundível.
A união entre poesia metrificada e arte visual transforma o cordel em um objeto cultural completo, onde texto e imagem se complementam para contar histórias.

Essa estética singular conecta o cordel às raízes mais profundas da cultura nordestina — simples, simbólica e profundamente humana.

Desafios e a Resiliência no Século XXI

Apesar da concorrência com as mídias digitais e da mudança nos hábitos de leitura, o cordel mostra uma extraordinária capacidade de adaptação.
Hoje, ele está nas redes sociais, escolas e universidades, conquistando novos públicos e sendo reconhecido oficialmente como Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro pelo IPHAN.

A força do cordel não está apenas em seu passado, mas em sua permanente relevância.
Apoiar um cordelista, ler um folheto ou compartilhar um verso é um ato de preservação da alma brasileira — é garantir que a voz do povo continue ecoando pelas gerações futuras.

Referências Bibliográficas

CASCUDO, Luís da Câmara. Vaqueiros e Cantadores: Folclore Poético do Sertão de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. Rio de Janeiro: Ediouro, 2002.

LUYTEN, Joseph M. O que é Literatura de Cordel. São Paulo: Brasiliense, 2005.

ABREU, Márcia. Histórias de Cordéis e Folhetos. Campinas: Mercado de Letras, 1999.

GALVÃO, Ana Maria de Oliveira. Cordel: Leitores e Ouvintes. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2011.

Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN. Dossiê de Registro da Literatura de Cordel como Patrimônio Cultural do Brasil. Brasília: IPHAN, 2018.

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