Contas
públicas. Pacote com aumentos para o funcionalismo, aprovado na quinta-feira,
opõe equipes política e econômica, que considera a medida prejudicial ao ajuste
fiscal
A decisão do presidente Michel Temer de autorizar, na
semana passada, os reajustes salariais para diferentes categorias de servidores
públicos abriu a primeira divergência entre a equipe econômica e os
articuladores políticos do PMDB. No Ministério Fazenda, o entendimento é que
não pode haver elevação de gastos, mesmo que seja para evitar desgastes ou
pacificar relações, como defendem caciques políticos do PMDB.
Para a equipe econômica, que têm a missão de imprimir o
corte mais duro e socialmente penoso da história nas contas público do Brasil,
é “incompreensível” que o governo em exercício faça a opção política de abrir
concessões, aumentando os gastos em bilhões de reais, para beneficiar o
funcionalismo público, parcela privilegiada de trabalhadores. A sinalização é
contraditória. Indica que o sacrifício inerente ao ajuste fiscal não será para
todos.
Causou mais descontentamento ainda o fato de esse apoio
não avaliar a conjuntura no mercado de trabalho: o incentivo do governo ao
reajuste dos servidores, que têm estabilidade no emprego, ocorreu na mesma
semana em Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou que
há 11,4 milhões de brasileiros desempregados na iniciativa privada, um número
recorde.
Segundo o Estado apurou, a Fazenda sequer foi envolvida
em discussões oficiais sobre o tema. A decisão veio do Planalto. Um procedimento
bem diferente ao adotado no trato de outras questões, igualmente sensíveis aos
cofres públicos, como a negociação da dívida dos Estados e municípios e a
fixação do déficit de R$ 170,5 bilhões, cujas reuniões sempre incluíram
representantes da Fazenda e do Planejamento.
Internamente, na Fazenda, o sentimento é de que decisões
políticas unilaterais, do próprio governo, podem atropelar e dificultar o
ajuste fiscal, que, por si só, já é complexo e tende a sofrer resistência do
Congresso e da população em geral.
Parte da equipe econômica, inclusive, rebate os
argumentos de que o governo deu em favor do reajuste. Diz ser fato que o
reajuste já estava acertado, que ficou abaixo da inflação e que já estava
contabilizado no déficit projetado pelo governo anterior, de R$ 96 bilhões.
Também alega ser fato que a despesa extra, de quase R$ 60 bilhões, será diluída
no tempo e não aplicada de uma vez só, neste ano. Mas nenhum dos argumentos
considera o essencial: é hora de cortar, não de elevar despesas, ainda mais
quando elas incentivam novas despesas.
O reajuste para servidores da União tem efeito cascata
nos Estados e municípios, onde os benefícios são atrelados a ganhos federais.
Os aumentos precisam ser aprovados pelos Legislativos, mas é quase certo que,
se passar no Congresso, vai chegar ao funcionalismo estadual e municipal no
pior dos momentos – quando não suportam pagar salários e aposentadorias.
Há um complicador adicional. O reajuste também
beneficiará inativos do serviço público. Ficará mais complicado explicar a
necessidade da reforma da Previdência, cujos impactos recaem principalmente
sobre os trabalhadores da iniciativa privada.
Fragilidade. Economistas que vinham dando voto de
confiança ao novo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, ficaram preocupados
com a postura do governo. Para José Márcio Camargo, economista-chefe da Opus
Investimentos, foi um sinal de fraqueza da equipe econômica: “Ou uma ou duas.
Ou Meirelles foi consultado e aceitou o argumento político em favor do reajuste
ou ele foi atropelado: de um jeito ou de outro, é péssimo para o ajuste.”
Marcos Lisboa, presidente do Insper e ex-secretário de
Política Econômica do Ministério da Fazenda, considerou o sinal muito ruim. “A
situação das contas públicos é gravíssima e o governo parece não ter entendido
o tamanho do problema quando cede para este ou aquele grupo de pressão. Hoje é
para os juízes, para os militares. E amanhã? Vai ser para quem?”
Por ALEXA SALOMÃO - O ESTADO DE S.PAULO
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