Como diria o Chico Jabuti, “quem sabe os escafandristas” um dia decidam investigar as relações do governo do PT com o jornalismo — ou com um troço que até pode lembrar jornalismo, mas que é outra coisa. Na abertura do seminário sobre corrupção, na semana passada, Dilma Rousseff fez o elogio da liberdade de informação: “Estou convencida de que, mesmo quando há exageros, e nós sabemos que, em qualquer área, eles existem, é sempre preferível o ruído da imprensa livre ao silêncio tumular das ditaduras”. Tá bom assim, vá lá. Incomoda-me um pouco a palavra “ruído” aí; sou tentando a perguntar em que sentido ela o empregou. Mas a fala é, sem dúvida, melhor do que aquilo que se ouve na rua petista.
Dilma tem deixado claro que não partirá dela iniciativas para violar a Constituição. Que bom! Conforta-me saber que temos uma presidente legalista. No governo do antecessor, como é sabido, houve mais de uma tentativa de submeter a imprensa à canga do poder. Mas a presidente carrega, sim, um passivo nessa área, herdado de seu padrinho político, que ela manteve intocado: o financiamento, com dinheiro público, da pistolagem política e ideológica travestida de jornalismo — especialmente na Internet. Estatais estampam seus respectivos logotipos em veículos que servem apenas para achincalhar os “inimigos do regime”.
A Folha deste domingo traz uma reportagem de Leandro Colon e Fábio Leite que dá uma pista de como as coisas se dão nessa área. Leiam trechos. Volto depois.
A Presidência da República gastou R$ 135,6 mil para fazer publicidade oficial em cinco jornais de São Paulo que não existem. As publicações fictícias são vinculadas à Laujar Empresa Jornalística S/C Ltda, com sede registrada num imóvel fechado e vazio, em São Bernardo do Campo (SP). Essa empresa aparece em 11º lugar num ranking de 1.132 empresas que, desde o início do governo Dilma Rousseff, receberam recursos públicos da Presidência para veicular propaganda do governo em diários impressos. Embora esteja à frente de empresas responsáveis por publicações de ampla circulação e tradição no país, como o gaúcho “Zero Hora” e o carioca “O Dia”, a Laujar não publica nenhum jornal.
Os cinco títulos da empresa beneficiados pela Presidência inexistem em bancas do ABC Paulista, onde supostamente são editados, não são cadastrados em nenhum sindicato de nenhuma categoria do universo editorial e são completamente desconhecidos de jornalistas e jornaleiros da região. Também não aparecem em cadastros municipais de jornais aptos a fazer publicidade de prefeituras.
Além disso, exemplares enviados à Presidência como provas de que as publicações existem contêm sinais de que são forjados. A Laujar mandou as supostas edições do dia 15 de março do ano passado do “Jornal do ABC Paulista”, “O Dia de Guarulhos”, “Gazeta de Osasco”, “Diário de Cubatão” e “O Paulistano”. Todas elas têm os mesmos textos -a única diferença é o nome da publicação. Uma das “reportagens” apresentadas contém declarações do então ministro do Trabalho, Carlos Lupi, dadas no próprio dia 15. O que torna impossível a impressão ter ocorrido na data informada nos jornais. Na verdade, o texto é uma cópia de uma nota publicada no site da Folha na tarde daquele dia.
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A Laujar, por exemplo, declarou que seus jornais tinham uma tiragem total de 250 mil exemplares, vendidos por R$ 2,50 cada. Se a informação fosse verdadeira, as supostas publicações da empresa teriam, juntas, uma circulação parecida com a do jornal “O Globo”, a quinta maior do país. A Secom informou que, em maio, excluiu a empresa de seu cadastro. Não pela inexistência dos cinco “jornais”, entretanto, mas porque segundo o órgão eles não falavam sobre questões específicas dos municípios onde circulavam.
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Encerro
Não basta Dilma Rousseff fazer sua profissão de fé na liberdade de imprensa. Até porque não devemos tomar como favor da Soberana o que, como diria Gregório de Matos, a lei “nos dá de graça”. Se quer mesmo atuar no setor de maneira democrática e transparente, tem de parar de injetar dinheiro público na pistolagem subjornalística. Afinal, a CEF, o BB e a Petrobras, por exemplo, também pertencem àqueles que não são petistas, àqueles que não votaram em Dilma, àqueles que escolheram outros partidos. Dilma pertence ao PT, mas foi eleita para governar todos os brasileiros, incluindo aqueles de quem ela não gosta e que eventualmente também não gostam dela.
Ou há algo de errado nessa minha afirmação?
(Reinaldo Azevedo - 11/11/2012 - às 3:56)
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