O senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) recusou-se a participar
da sessão em que foi aprovada no Senado a medida provisória dos portos. Ele foi ao plenário,
expressou sua contrariedade e foi para casa. “Não me animei a ficar lá, feito
um idiota, coonestando aquilo tudo”, disse o senador em entrevista ao blog.
“Achei melhor me aborrecer vendo pela televisão.” Jarbas classifica o processo
de votação de “farsa”. Sustenta que o Legislativo vive hoje “uma situação pior
do que a que atravessamos na época da ditadura.” Abaixo, a conversa:
— Por que não permaneceu no
plenário? Fui ao plenário para
registrar minha contrariedade com o absurdo a que o Senado foi submetido. Renan
disse que, a partir de agora, não recebe mais medida provisória a menos de sete
dias de vencer o prazo de validade. Afirmou que essa MP dos Portos seria uma excepcionalidade.
Admitiu que é uma aberração. Mas recebeu. Não tenho nenhuma razão para
acreditar nele. Na semana passada, o Senado já havia votado uma medida
provisória recebida na véspera, sem respeitar nem o prazo mínimo de 48 horas.
Foi dito que aquilo era uma exceção, que não se repetiria. Antes, na votação do
projeto de lei que inibe a criação de partidos políticos, foi feita uma votação
simbólica. Eles perderam. Renan fingiu que não viu. Foi preciso pedir votação
nominal para derrubar a sessão por falta de quórum. O STF depois suspendeu a
tramitação da proposta. Como podemos dar crédito a esse tipo de gente?
— Não se animou a enfrentar o
embate dos portos? Nunca fui de fugir de
embates. Mas esse embate eu já sabia o resultado. Por isso, não vi razão para
permanecer em plenário. Ao contrário do que fez o presidente da Câmara,
Henrique Alves, que conduziu a votação com decência, o Renan já havia deixado
claro na véspera que iria atropelar. Não me animei a ficar lá, feito um idiota,
coonestando aquilo tudo. Vim para casa. Achei melhor me aborrecer vendo pela
televisão.
— Do modo como fala tudo parece
reduzir-se a um teatro, é isso? Sem dúvida nenhuma. É uma farsa. Uma farsa comandada por alguém
que não tem credenciais para que ninguém acredite nas suas boas intenções. Além
disso, o teatro dessa vez é de horrores.
— Que horrores? Eu assisti pela televisão a um debate de altíssimo nível entre
duas figuras de reputação ilibada. Um responde a um processo no Supremo
Tribunal, o outro está condenado, em primeira instância, por formação de
quadrilha. Todos os dois acusam o governo de ter colocado penduricalhos dentro
da chamada MP dos Portos.
— Refere-se aos líderes do
PMDB, Eduardo Cunha, e do PR, Anthony Garotinho? Sim, todo mundo viu. Foi
televisionado. Como é que eu poderia votar isso aqui, sem tomar conhecimento e
sem poder emendar? Como é que o Senado da República vai votar uma medida
provisória em que duas pessoas de alto nível, de reputação ilibada, lá da Câmara,
dizem que esta MP não presta, que esta MP atende a pessoas, a grupos e a
empresas? Não dá.
— Que avaliação faz da votação
da MP dos Portos na Câmara? A Câmara, que tinha uma
imagem muito ruim, cumpriu o seu papel. O Henrique Alves pode ter todos os defeitos,
mas presidiu as sessões de maneira satisfatória. Deixou a oposição falar,
permitiu que todos se manifestassem. Em momento nenhum o presidente da Câmara
tentou estrangular a oposição. A oposição fez várias questões de ordem. Umas
foram acatadas; outras rejeitadas. Tudo dentro de um processo democrático. O
resultado final foi acolhido por todos os lados.
— E no Senado? A farsa começa pelos
prazos. A medida provisória chega ao Senado no último dia, a poucas horas de
perder a validade. Todo mundo já sabia qual seria o resultado. Renan chegou lá
disposto a votar de qualquer jeito. Na véspera ele já tinha anunciado na
televisão que trataria a medida como excepcional. Tudo em nome do interesse do
país. Ora, que interesse do país é esse que nega aos senadores o direito de
votar com consciência? Dilma é estatizante. Ela tem vergonha da palavra
privatização. Quem pode acreditar que a presidente Dilma tem interesse em
modernizar portos? Só os tolos. Oou aqueles que servem ao governo a todo custo.
— Haveria outras formas de
tratar do assunto? Claro. O governo poderia
enviar ao Congresso um projeto de lei. Se quisesse, poderia requerer o regime
de urgência. A análise se daria rapidamente. Não é verdadeira essa conversa de
que são contrários à modernização dos portos os parlamentares que se negam a
participar dessa farsa. Vivemos hoje uma situação pior do que a que
atravessamos na época da ditadura.
— Como assim? Na época da ditadura,
fui deputado federal em dois mandatos. Nessa época, para subir à tribuna era
preciso ter coragem cívica e também física. Pois a ditadura tinha determinados
acanhamentos de fazer as coisas em determinadas ocasiões. Só havia dois
partidos: Arena e MDB. Em determinados momentos, a Arena ficava meio encabulada
de massacrar o MDB. Agora é diferente. Eles fazem o que querem. Anunciam
claramente o que vão fazer. E fazem.
— Quem é responsável por esse
quadro, o Executivo que liga o trator ou o Legislativo que aceita ser
tratorado? A responsabilidade é dos
dois. O Executivo porque faz tudo sem nenhum apreço às regras mais básicas do
processo democrárico. E o Legislativo porque não se contrapões nem se impõe.
Aceita passivamente as coisas. A Câmara, nessa semana, viveu momentos inusuais.
No Senado, Renan faz o que quer.
— Renan se queixou do recurso que
a oposição protocolou no STF para tentar suspender a sessão. O que achou? Não vejo o menor
problema em recorrer ao Supremo. Mandei dizer para o Agripino Maia que, se
precisassem de minha assinatura, eu estava à disposição. O Supremo é uma
instância recursal. Então a gente é massacrado e tem que ficar calado? Na
ditadura não adiantava recorrer ao Supremo. Agora, pelo menos nesse aspecto, é
diferente.
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