Imagem: AFP/ Evaristo Sa |
Aconteceu na Itália com a investigação "Mãos
Limpas" e é possível que aconteça no Brasil, com o Petrolão: o Congresso
nacional contra-ataca com um arsenal de projetos de leis que visam proteger os
parlamentares do avanço das investigações da Lava Jato.
As tentativas se aceleram ante a iminência da confissão
em massa de executivos da empreiteira Odebrecht, ponto nevrálgico do
megaescândalo que envolve parlamentares, governadores e políticos de primeira
linha no desvio de bilhões de dólares dos cofres públicos.
A guerra entre a Justiça e os principais partidos está
vindo à tona, com a multiplicação de iniciativas parlamentares para tentar
limitar a ação judicial.
"Quanto mais se aproximam as investigações de quem
está no poder, mais reações surgirão. Se a impunidade perder força, aqueles que
se imaginavam imunes à justiça criminal buscarão criar mecanismos que impeçam a
continuidade da investigação", afirmou à AFP o presidente da Associação de
Juízes Federais do Brasil, Roberto Veloso.
A Câmara de Deputados discute o projeto de medidas contra
a corrupção impulsionada pela Lava Jato, mas, paradoxalmente, a iniciativa
poderá abrir as portas para uma autoanistia do crime de "Caixa 2", as
doações de campanha não declaradas, que visam encobrir delitos como lavagem de
dinheiro e corrupção.
Caso se converta em lei, a nova tipificação do
"Caixa 2" isentaria de culpa políticos que agora estão na mira da
justiça, porque a lei não pode ser aplicada de forma retroativa, ao menos
segundo uma leitura que ganha força no Congresso.
"Se criminalizarem todos que usaram o Caixa 2, vão
acabar com essa geração política", afirmou à AFP um assessor de um dos
principais partidos brasileiro, que não quis ser identificado.
Do outro lado da rua
O procurador geral da República, Rodrigo Janot, advertiu
para o risco na semana passada e pediu para que o país não esqueça as lições da
megainvestigação de corrupção na Itália, ao lembrar as 13 medidas aprovadas
pelo Parlamento italiano para abalar a operação "Mani pulite".
O deputado Onyx Lorenzoni, relator do pacote
anticorrupção que deve ser submetido à votação no Congresso, reconheceu o
nervosismo com a proximidade da delação da Odebrecht.
De acordo com a imprensa, o ex-presidente da empreiteira
Marcelo Odebrecht, condenado em 2015 a quase 20 anos de prisão, e dezenas de
executivos da empresa estão próximos de fechar um acordo em troca de redução da
pena.
"Sem dúvida alguma isto preocupa e talvez explique
as tentativas de limitar as investigações. Há muitas pessoas que têm problemas
com a Lava Jato", afirmou à AFP o deputado do partido DEM.
Nos bastidores, os deputados federais afirmam que a
tensão é maior no Senado.
O presidente do Senado, Renan Calheiros, um dos grandes
nomes do PMDB do presidente Michel Temer, não escondeu a irritação no mês
passado quando a PF prendeu quatro policiais legislativos por suspeitas de
realizarem varreduras para eliminar escutas instaladas com autorização da
Justiça.
Calheiros enfrenta oito processos no STF, a maioria por
causa da Petrobras. Após o incidente ele apresentou um projeto de sua autoria
para punir "abusos de autoridade" de agentes públicos e pediu o corte
nos pagamentos das aposentadorias de membros do Poder Judiciário que cometeram faltas
contra a administração pública.
Janot afirma que a proposta abre a possibilidade de
criminalizar juízes por seu trabalho.
"A sociedade deve se manter vigilante (...),
observar o Congresso e acompanhar atentamente os debates sobre as medidas
contra a corrupção", afirmou nesta quinta-feira o promotor Athayde Ribeiro
Costa após a prisão do ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral.
"Caça às bruxas"
No Senado, também foi instalada uma comissão para
detectar "supersalários" no setor público.
A iniciativa é vista como outra mensagem ao sistema
judiciário, onde há suspeitas das mais flagrantes violações do teto de renda
permitido para a categoria.
A senadora Kátia Abreu, responsável por documentar o
trabalho desse órgão, se viu obrigada a garantir que não haverá "uma caça
às bruxas".
Mas o juiz Veloso não tem dúvidas: este dispositivo
"foi montado contra a Lava Jato".
Em linha com a mais recente ofensiva legislativa, a
Câmara dos Deputados tentou votar na última semana um amplo perdão para delitos
cometidos por executivos se suas empresas reconhecessem suas infrações,
contribuindo com informações para esclarecer os fatos e ressarcindo
economicamente o Estado.
"Se este projeto for aprovado, no silêncio da noite
(...) permitirá anistiar crimes investigados pela Operação Lava Jato",
disseram os promotores em um duro comunicado.
A medida foi retirada da agenda até novo aviso.
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