As Origens Mitológicas: Entre Deuses e Heróis Trágicos
Diferente de muitas cidades gregas, a fundação de Tebas está
profundamente enraizada na mitologia. Sua história começa com Cadmo, um
príncipe fenício que, em busca de sua irmã Europa, foi orientado pelo Oráculo
de Delfos a fundar uma cidade. No local designado, Cadmo matou um dragão
sagrado de Ares e, por conselho da deusa Atena, semeou os dentes da criatura na
terra. Desses dentes brotaram guerreiros ferozes, os Spartoi
("homens semeados"), que lutaram entre si até restarem apenas cinco.
Estes se tornaram os ancestrais das famílias nobres de Tebas. A cidadela da
cidade, a Cadmeia, levou o nome de seu fundador.
Tebas é, talvez, mais conhecida por ser o palco do Ciclo
Tebano, uma coleção de histórias trágicas que rivalizam em importância com
a Guerra de Troia. É a cidade de Édipo, o rei amaldiçoado que, sem saber, matou
seu pai e se casou com sua mãe, e de seus filhos, que lutaram até a morte pelo
trono. É também a terra natal de Antígona, cuja desobediência civil ao enterrar
seu irmão se tornou um arquétipo da luta entre a lei divina e a lei dos homens.
Além disso, o maior de todos os heróis gregos, Héracles (Hércules), também
nasceu em Tebas. Essa herança mitológica conferiu à cidade um prestígio imenso,
mas também uma aura de tragédia e predestinação.
A Trajetória Histórica: De Potência Regional a Hegemonia
Grega
Historicamente, Tebas emergiu como a cidade dominante da
Liga da Beócia, uma confederação de cidades da região. Sua trajetória política
foi marcada por uma intensa rivalidade com Atenas, sua vizinha ao sul, e por
uma postura pragmática, muitas vezes controversa.
Durante as Guerras Persas (480-479 a.C.), Tebas tomou a
decisão infame de se aliar ao Império Persa contra as outras cidades-estado
gregas, um ato conhecido como "medismo". Essa escolha manchou sua
reputação por gerações. Na Guerra do Peloponeso (431-404 a.C.), Tebas aliou-se
a Esparta contra Atenas, desempenhando um papel crucial na derrota ateniense.
O apogeu de Tebas, no entanto, ocorreu no século IV a.C., um
período conhecido como a Hegemonia Tebana. Após o fim da Guerra do
Peloponeso, a tirania de Esparta gerou ressentimento por toda a Grécia. Sob a
liderança de dois generais geniais, Epaminondas e Pelópidas,
Tebas desafiou o poderio espartano. O exército tebano foi reformado,
destacando-se pela criação do Batalhão Sagrado de Tebas, uma tropa de
elite composta por 150 pares de amantes masculinos, cuja lealdade e coragem em
batalha eram lendárias.
A inovação tática de Epaminondas, a falange oblíqua,
foi decisiva. Na Batalha de Leuctra (371 a.C.), ele concentrou suas
forças no flanco esquerdo, sobrecarregando a ala direita espartana —
tradicionalmente a mais forte — e quebrou a invencibilidade militar de Esparta
que durava séculos. Esta vitória chocou o mundo grego e inaugurou um breve
período de domínio tebano. Tebas invadiu o Peloponeso, libertou os hilotas da
Messênia (uma população servil sob controle espartano) e reconfigurou o mapa
político da Grécia.
O Declínio e a Destruição
A hegemonia tebana foi brilhante, mas curta. Sua liderança
dependia quase inteiramente do gênio de seus líderes. Pelópidas morreu em
batalha em 364 a.C., e o próprio Epaminondas caiu na Batalha de Mantineia (362
a.C.). Embora a batalha tenha sido uma vitória tática para Tebas, a morte de
Epaminondas foi uma perda irreparável. Com sua morte, a ambição tebana
desvaneceu-se.
Enfraquecida, Tebas foi forçada a se aliar a Atenas contra a
crescente ameaça de Filipe II da Macedônia. A derrota na Batalha de Queroneia
(338 a.C.) marcou o fim da independência das cidades-estado gregas. Após a
morte de Filipe, Tebas se rebelou contra seu filho, Alexandre, o Grande, em 335
a.C. A resposta de Alexandre foi implacável: ele sitiou a cidade e, após
conquistá-la, a arrasou completamente. A população foi massacrada ou vendida
como escrava, e os edifícios foram demolidos, com exceção dos templos e da casa
do poeta Píndaro. A destruição de Tebas serviu como um aviso aterrorizante para
o resto da Grécia sobre o custo de desafiar o poder macedônio.
Legado
Embora Tebas nunca tenha recuperado sua antiga glória, seu
legado perdura. Ela representa o arquétipo da "terceira potência", um
poder que surge para desafiar uma ordem estabelecida, mas que não consegue
sustentar seu domínio. Suas inovações militares influenciaram táticos por
séculos, incluindo Filipe II e o próprio Alexandre. Acima de tudo, sua rica
mitologia forneceu material para algumas das maiores obras da literatura
ocidental, garantindo que, mesmo em ruínas, a história de Tebas continuasse a
ser contada.
Referências Bibliográficas
- Buckler,
John. The Theban Hegemony, 371-362 BC. Harvard University
Press, 1980. — Considerada a obra acadêmica definitiva sobre o período de
domínio tebano.
- Hanson,
Victor Davis. The Soul of Battle: From Ancient Times to the Present
Day, How Three Great Liberators Vanquished Tyranny. The Free Press,
1999. — Contém um capítulo extenso e analítico sobre Epaminondas e a
campanha de libertação da Messênia.
- Cartledge,
Paul. Thebes: The Forgotten City of Ancient Greece. Abrams
Press, 2020. — Uma biografia moderna e abrangente da cidade, desde seus
mitos até seu fim.
- Hornblower,
Simon. The Greek World, 479-323 BC. Routledge, 2011. — Um
panorama excelente do período clássico que contextualiza a ascensão e
queda de Tebas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário