Ex-embaixador brasileiro em Washington acredita que
sofreu espionagem dos EUA
DE SÃO PAULO
Rubens Barbosa, que esteve à frente da
Embaixada do Brasil em Washington de junho de 1999 a março de 2004, disse que
acredita ter sofrido espionagem do governo americano no ano de 2001, na véspera
de uma visita do então presidente Fernando Henrique Cardoso aos EUA.
Segundo Barbosa, nos dias em que estava
sendo planejada a visita do presidente, que aconteceria alguns meses depois, os
telefones da embaixada tiveram perda de qualidade no áudio e ficaram mudos por
alguns dias.
Após ter pedido a uma empresa americana
a varredura dos aparelhos, Barbosa foi informado de que, embora não existissem
escutas no interior da embaixada, os cabos telefônicos do edifício --que
passavam pela avenida Massachusetts, endereço de muitas outras representações
diplomáticas-- faziam ligação com o Departamento de Defesa norte-americano. E
que reclamações similares ao que ele fazia eram comuns em outras embaixadas nas
vésperas de visitas presidenciais.
A história foi revelada pela Folha,
em reportagem de agosto de 2001.
“Eu pensava que era algum aparelho na
embaixada e fiz um rastreamento. Mas não era. Era fora. Ninguém violou o
território brasileiro. Ninguém entrou na embaixada para gravar nada. Isso tudo
era monitorado pelo cabo geral."
Questionado se possuía algum documento
técnico que comprovasse esse problema na época, Barbosa disse que talvez exista
algum papel administrativo sobre o caso, mas que não tem como comprovar a
informação.
Segundo Barbosa, o governo brasileiro e
o Departamento de Estado norte-americano foram avisados do problema, mas não
houve resposta de nenhum dos dois sobre o acontecimento.
O ex-embaixador também disse que em
nenhuma outra ocasião teve problemas similares e que não perguntou a chefes
diplomáticos de outros países se eles já tinham sofrido experiências parecidas.
Questionado sobre se, com as revelações
de Edward Snowden, houve uma mudança de postura do governo brasileiro, em
comparação à sua experiência na embaixada, Barbosa disse: "Não podemos
comparar uma coisa a outra. Minha experiência em Washington foi algo limitado,
que identifiquei e informei. Não havia nada a fazer. O que está acontecendo
hoje é uma denúncia de alguém com documentos americanos que mostram que no
Brasil e em mais 15 países foram construídas estações para monitorar o trânsito
de informações. E essas informações não diziam respeito só ao Brasil, mas ao
fluxo de internet, telefone e emails que passam pelos cabos que estão na costa
brasileira. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. A reação agora
tinha que ser maior porque ela entra num universo muito maior."
Ele também elogiou a postura brasileira
diante das denúncias trazidas pelo ex-técnico da CIA: "Eu acho que o que o
governo brasileiro está fazendo é correto: protestando, dizendo que vai levar
esse assunto para a ONU. Isso não aconteceu só com o Brasil, está acontecendo
com a Europa também. O modelo que estamos seguindo é o modelo europeu, que é
muito positivo. Tem essa reação forte, contra essas práticas ilegais e o pedido
de regulamentação internacional, mas também há uma dose de pragmatismo, de não
prejudicar as relações bilaterais e de não deixar que isso contamine o restante
das relações"
RELATO
O episódio de suspeita de grampo dos
aparelhos telefônicos da embaixada brasileira em Washington foi narrado por
Barbosa no livro "O Dissenso de Washington" (Editora Agir, 2011), em
que ele relata os bastidores da relação entre os governos americano e
brasileiro durante 1999 a 2004:
"Em março de 2001, antes da visita
de FHC, os telefones da embaixada começaram a apresentar sensível perda de
qualidade e ficaram mudos. Encomendei uma varredura que constatou existir o que
parecia ser uma ligação telefônica direta entre o prédio da chancelaria e o
Departamento de Defesa norte-americano. Após novas checagens, informei a
Brasília que tinha certeza da existência de grampo nas linhas telefônicas e
comuniquei o fato ao Departamento de Estado. Os técnicos que nos ajudaram
disseram que problemas semelhantes vinham ocorrendo em outras embaixadas,
sempre às vésperas de visitas presidenciais."
ESPIONAGEM
Em entrevista à Folha em
junho, Celso Amorim também expressou a desconfiança de que teria
sido espionado pelos Estados Unidos : "Em dois momentos eu
achei que os meus telefones estavam sendo gravados. Um, quando eu morava nos
EUA e era embaixador na ONU. Cuidava de três comissões sobre a questão do
Iraque. Meu telefone começou a fazer um ruído muito estranho, e, quando acabou
a comissão sobre Iraque, acabou o ruído também. Ali havia um foco óbvio."
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